O que é a morte? Não há resposta unânime para tal condição cercada de dúvidas e tabus, apesar de ser nossa única certeza em vida. Somos seres finitos, porém nos deparamos com um contexto sócio-histórico de negação acerca do tema. Nesse sentido, o homem tende a não pensar sobre a sua finitude e das pessoas que o rodeiam. De modo geral, nota-se um despreparo a respeito do enfrentamento dessa situação. É, então, neste contexto que a Psicologia – enquanto ciência que lida com seres humanos e suas vidas e, consequentemente, com a morte – assume papel fundamental para o entendimento e a aceitação de uma realidade comum a todos.

Ao longo do desenvolvimento humano, as pessoas têm contato com perdas desde a infância. A maneira como a morte é compreendida está relacionada às mais variadas culturas no decorrer do tempo. Segundo a psicóloga Wilma da Costa Torres, pioneira nas pesquisas sobre a Tanatologia – estudo científico da morte –, “se a morte é inevitável, sabemos conscientemente que é psicologicamente ingênuo ou filosoficamente insustentável negar sua importância”. Mas será que o homem atual compreende a morte dessa maneira?

 

 

Na antiguidade a morte era tratada com menos temores e de forma mais harmoniosa. Entretanto, hoje ela é vista com negativismo, principalmente no mundo ocidental, sendo a responsável por interromper projetos de vida e representar fracasso. Por isso cada vez mais autores esforçam-se em refletir e discutir o tema, para que possa ser encarado de forma natural, como parte do ciclo vital de todos os seres humanos.

Quanto mais resistência à aceitação da morte, mais sofrimento é gerado, podendo desencadear diferentes quadros patológicos, como depressão, devido à perda de vínculos afetivos, despertando sentimentos de desamparo e frustração. Por outro lado, diante da perda há a possibilidade de fortalecimento, evidenciando diferentes formas de seu enfrentamento, por meio de assimilação gradativa e reações ao processo. O luto nos leva a criar um sentido para a experiência da perda. Cada pessoa vai dar um significado diferente e único a essa experiência, reagindo à sua maneira e ao seu tempo.

Pandemia – Com a atual situação de pandemia causada pelo vírus da Covid-19, todos nós vivemos uma espécie de luto, com muitas perdas de diferentes formas: mudança abrupta da rotina, desemprego, problemas financeiros, isolamento social e, claro, mortes de pessoas conhecidas, amigos e até familiares.

A passagem de um ente querido é devastadora. Por isso os rituais fúnebres são tão relevantes, por conferirem algum sentido em meio ao caos do sofrimento profundo. Neste processo de homenagens, preces e consolos, elaboramos o luto; abraçamos e somos abraçados. Mas o que fazer quando tal ritual nos é negado sob o compreensível argumento de evitar contaminação nos casos em que a pessoa tenha falecido em decorrência do coronavírus?

Uma alternativa válida, na opinião do psicólogo Rodrigo Luz, é criar rituais simbólicos que estabeleçam um sentido na história do vínculo que se tem com a pessoa que se foi. Reunir familiares e amigos por meio de plataformas digitais é um bom caminho. “A pessoa é mais do que a morte dela. Sua morte faz parte de um único dia. Em todos os outros dias, houve vida. E você esteve presente em várias dessas ocasiões”.

Outro estudioso do assunto, o psiquiatra britânico Colin Parkes ressalta que o luto é o “preço do amor”. Segundo ele, se existe luto é porque a pessoa criou “vínculos, trocas, afeto, histórias de vida compartilhadas”. Nossos entes podem ter se extinguido fisicamente, mas continuam tendo morada interna em nossas lembranças, no legado deixado por eles.

Enfim, diante de tantas palavras de conforto, nos resta celebrar a vida como melhor maneira de suplantar a morte.

 

Dra. Wania Lima Barroso Ferraz

Psicóloga - CRP 01/11184